Estamos no Ramadão. Aqui em Madrid, onde vivo há um ano e meio, não tenho o cabrito guisado da minha mãe, nem as dolmeh da minha tia para comer antes do sol nascer. Nem tenho as vozes delas a dizer “Almir, come mais um pouco, serão muitas horas de jejum.”
Aqui ninguém cuida de mim e, mesmo eu deixarei de cuidar de existir muito em breve.
Depois de tudo escrupulosamente arrumado na mochila, pego-a com cuidado e coloco-a às costas. Pego num punhado de tâmaras para comer pelo caminho, pois não há fruto mais delicioso para mim e saio, no preciso minuto que estava planeado sair. Tremo um pouco, sim, tremo. O Mundo deve julgar que não, tal como julgará os meus actos também, mas confesso que tremo. Tremo como se estivesse nu em plena Sibéria.
Os senhores da meteorologia acertaram no céu nublado que previam para esta última sexta-feira de Maio.
Desço as escadas da estação de metro Acacias, no preciso minuto que estava planeado descer. Tremo. A carruagem chega à plataforma e eu entro. Fico junto à porta. Tremo. O metro estava cheio, completamente lotado. Em hora de ponta, não sobra um milésimo espaço entre nós e a pessoa do lado, completa e incomodativamente colada a nós. O metro arranca, no preciso minuto que estava planeado arrancar.
Eu tremo. Eu duvido. Eu tremo. Mas tem de ser, repito para mim “Tem de ser!”. Não se pode voltar atrás. Jamais.
O grito ecoa “Allahu Akbar”!!!
No escuro túnel do metro, entre a confusão de pessoas amontoada dentro da carruagem, um estrondo ensurdecedor explode em caos e o inferno instala-se. Uma bomba!
Eu tremo. Tremo tanto de medo, panicamente em terror. Baixo-me e tento proteger-me. Tenho medo de morrer. Tremo de medo de morrer às mãos de quem não sabe como é bom viver.
[Foto: a neta da Dulce]
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